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Num país onde o povo é sistematicamente empurrado para a sobrevivência por conta própria, é inaceitável que seus dirigentes se comportem como cortesãos medievais que se curvam ao rei muitas vezes déspota e corrupto (alias, há indícios de similaridades neste aspecto). A recente atitude da Governadora da Província de Gaza, durante a visita do Presidente da República, não é apenas lamentável, é um ultraje à ética pública e uma bofetada na face de todos os cidadãos que ainda acreditam num Estado comprometido com a justiça social e igualmente um incomensurável insulto aos miseráveis que abundam aquela província, especialmente mais a norte da mesma, que vezes sem conta dormem sem nada colocar na boca por causa da cíclica estiagem, como destacamos mais a frente.
A governadora, de forma ostensiva e publicamente teatral, entregou ao Presidente produtos agrícolas e animais locais de valor material elevado, uma verdadeira riqueza se considerarmos os níveis de pobreza do país. Num primeiro olhar, pode parecer um simples gesto de cortesia. Mas analisado em profundidade, é expressão clara de uma prática de bajulação política institucionalizada e que nos remete ao passado secular, aos tempos dos reinados. Doravante, esse acto revela o tipo de liderança que se instalou em certos quadrantes do nosso governo, uma liderança moldada pela fidelidade partidária, alimentada pelo culto à personalidade, e profundamente desconectada das reais necessidades da população.
É importante frisar que a Província de Gaza não é um território de fartura como se tentou mostrar com aquela fanfarra mediática, ao contrário, é uma das mais assoladas pelas intempéries naturais e pela negligência do poder central. As secas, sobretudo no norte da província, devastam culturas, desestruturam economias familiares e semeiam fome há décadas. Famílias inteiras sobrevivem à base de donativos de ONGs e campanhas de solidariedade. E é nesse cenário que a governadora aparece, não para distribuir alimentos ao povo, mas para presentear o Presidente, alguém que, pela sua posição, já vive confortavelmente às custas dos recursos públicos.
Esse gesto escancara a desconexão entre os dirigentes e a população. Enquanto mães enterram filhos desnutridos e camponeses perdem colheitas por falta de apoio técnico, a governadora opta por alimentar o ego de um líder político que deveria estar na província para ouvir, apoiar e servir e não para ser mimado com presentes que simbolizam a subserviência política.
O mais preocupante, porém, é que essa atitude não é isolada. Essa governadora reflecte uma cultura política fossilizada, enraizada na lógica da obediência cega e do culto à figura presidencial. Trata-se de uma mentalidade feudal, incompatível com as exigências de uma democracia moderna. Em democracias verdadeiras, o governante não é bajulado, é fiscalizado. Não é servido, serve. Não é homenageado com oferendas simbólicas , é cobrado por resultados concretos.
Ao agir como agiu, a governadora mostrou não ter estatura moral nem consciência social para exercer cargo público sendo que perdeu uma oportunidade sublime de mostrar cometimento com o desenvolvimento, ficando para história pela pior razão. Demonstrou que sua prioridade não é o povo que governa, mas sim o partido que a nomeou. A sua actuação é prova cabal de que o mérito não foi o critério principal para sua ascensão ao cargo, estando cada vez mais claro que o que a elevou àquela posição foi, muito provavelmente, a sua disposição para agradar os detentores do poder, mesmo que isso implique trair os interesses da população que deveria representar, deixando claro do que ela foi capaz de fazer para chegar a aquele cargo cobiçado, as guerrinhas com o famoso Agostinho Vuma na luta pelo tacho mostra de forma translúcida o tipo de jogos sujos a que estão dispostos a fazer pelo poder.
Entretanto, a cerimónia, transmitida com pompa e circunstância pelos meios de comunicação, foi mais um episódio de encenação política, onde o sofrimento do povo é invisibilizado para que o espetáculo da obediência e do louvor ao chefe se perpetue. A governadora não apenas falhou com seu povo, ela insultou sua inteligência.
O povo de Gaza não precisa de cerimónias bajuladoras. Precisa de políticas públicas eficazes. Precisa de investimento em irrigação, apoio técnico à agricultura familiar, acesso à água potável, escolas funcionais e hospitais com medicamentos. Precisa de dirigentes que ouçam, que caminhem nas aldeias, que sintam a dor da população, não que a explorem politicamente.
Esse gesto simbólico da governadora mostra, de forma clara, que há uma inversão total de prioridades. O Presidente não precisa de produtos agrícolas, quem precisa são os órfãos da seca, os camponeses abandonados, as viúvas da fome. O gesto, portanto, além de eticamente condenável, é politicamente desastroso.
Em tempos modernos, tais práticas deveriam merecer moções de censura. Mas em Moçambique, tornam-se rotinas normalizadas, como se fizessem parte de um ritual palaciano herdado de um tempo em que a política se fazia nos salões, e não nas ruas. Precisamos romper com essa lógica. Precisamos de dirigentes que vejam o povo como patrão, e não como massa de manobra.
A província de Gaza continuará condenada ao subdesenvolvimento enquanto for governada por figuras mais preocupadas em agradar ao Presidente e ao partido e afazer fortuna pessoal do que em servir ao povo. A cultura da bajulação precisa ser enfrentada com coragem e firmeza. É urgente que o povo desperte para o facto de que dirigentes que se ajoelham perante o poder dificilmente se levantam para defender os interesses populares.
A senhora governadora deve explicações ao povo. E mais: deve rever, profundamente, sua postura enquanto dirigente pública. Porque a sua actuação recente não foi apenas infeliz, foi imoral, injusta e descomprometida com os valores de um Estado democrático.
Ergo aqui, simbolicamente, um cartão amarelo escurecido. Porque este é mais do que um aviso, é uma denúncia pública. E que sirva de exemplo a todos os outros que, ao invés de liderar com dignidade, preferem rastejar por favores e prestígio.
A história é implacável com os bajuladores. E o povo, mesmo que silenciado hoje, amanhã poderá falar mais alto e cobrar.

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