Cartão Amarelo para Renamo

A Renamo está vivendo um momento crítico, resultado de decisões internas que levaram à sua quase completa derrota nas eleições gerais de 2024. Essa crise não é obra do acaso, mas consequência de erros estratégicos profundos cometidos no interior do próprio partido, sobretudo durante o famigerado congresso de 2024. Foi ali que se decidiu, de forma controversa, reconduzir Ossufo Momade como presidente e candidato presidencial, ignorando completamente Venâncio Mondlane, um quadro que desde cedo se mostrou capaz de mobilizar a base e reacender esperanças reais de mudança.

A exclusão de Mondlane foi um dos maiores equívocos da Renamo nos últimos tempos. Ele não apenas trabalhou incansavelmente para que o congresso pudesse acontecer, como também reuniu apoio significativo para concorrer à liderança do partido. Ignorá-lo representou uma rejeição explícita às aspirações da base e à voz do povo, que já havia demonstrado, nas eleições autárquicas, um desejo claro por renovação e liderança autêntica. Os sinais eram evidentes, mas foram simplesmente desprezados, e os resultados eleitorais vieram confirmar o preço alto dessa escolha: uma derrota histórica e humilhante.

Mais do que um erro individual de Momade, essa situação revela uma manipulação por parte da classe intelectual dentro da Renamo, que soube explorar as fragilidades do líder. Essa elite interna, ao invés de fortalecer o partido, apostou numa espécie de acomodação que acabou por fragilizar ainda mais a oposição. Ao receber regalias e concessões da Frelimo, Momade foi pouco a pouco sendo ofuscado, sua liderança corroída, enquanto o partido perdia força, coesão e a confiança dos eleitores.

As manifestações de repúdio que se seguiram, culminando no fechamento de sedes da Renamo por todo o país, são um sintoma alarmante da profunda crise interna. É impossível não questionar a posição de muitos militantes e quadros que agora protestam: onde estavam quando a Comissão Política decidiu pela recondução de figuras como André Magibire (Mafuta) e seus aliados? Por que não se posicionaram contra esse retrocesso antes que fosse tarde demais? Se houve conivência ou silêncio, eles também compartilham a responsabilidade pelo colapso que hoje enfrentamos.

É necessário que haja uma responsabilização clara desses atores, pois a Renamo não pode se dar ao luxo de repetir os mesmos erros e esperar resultados diferentes. A complacência que permitiu a continuidade de lideranças que falharam estrondosamente no passado é parte do que condena o partido ao retrocesso. O futuro da Renamo depende da sua capacidade de promover uma autocrítica profunda e de abrir espaço para vozes novas e legítimas, que possam restaurar a ligação do partido com a população e sua missão histórica.

Não podemos deixar de destacar o papel de figuras públicas que, ao longo dos últimos anos, se colocaram como porta-vozes da Renamo, mas que, na prática, acabaram por minar a força do partido ao negar a vontade popular. Nomes como António Muchanga, Ivone Soares, Elias Chalaua, José Manteigas, Alfredo Magumisse e Manuel de Araújo Carvalho personificam esse problema. Eles deram visibilidade a um projeto que negou, tacitamente, as aspirações de mudança do povo moçambicano e colaboraram para o enfraquecimento da oposição num momento decisivo.

Ao adotarem essa postura, essas figuras contribuíram decisivamente para que a Frelimo consolidasse seu domínio, aproveitando-se da fragilidade e divisão internas da Renamo para manipular o processo eleitoral. A oposição, fragmentada e desmoralizada, viu-se reduzida a uma sombra do que já fora, incapaz de oferecer uma alternativa viável ao governo que domina o país há décadas. Com bases cada vez mais frágeis e sem um discurso coeso, a Renamo caminha para uma irrelevância política que poderá ser definitiva se não houver mudanças profundas.

A nostalgia pelo legado de Afonso Dhlakama, fundador e símbolo da resistência da Renamo, não pode impedir a necessária transformação do partido. A Renamo do presente não é a Renamo do passado, e insistir em velhas fórmulas ou lideranças que já não representam as expectativas da população é condenar o partido a continuar sua queda. A sobrevivência da Renamo exige, urgentemente, uma renovação interna que vá além das aparências e alcance a essência da organização.

Essa renovação passa por uma revisão estatutária ampla, por processos democráticos internos que permitam o surgimento de lideranças capazes de dialogar com o povo e os novos tempos. É imperativo reintegrar figuras como Venâncio Mondlane, que têm legitimidade e carisma para reconstruir pontes entre o partido e a sociedade. Sem uma base sólida e uma liderança capaz, a Renamo continuará a sangrar, perdendo terreno para forças políticas que, mesmo com falhas, apresentam maior capacidade de mobilização.

O momento exige coragem para enfrentar os próprios erros, para reconhecer que a acomodação, o clientelismo e a resistência à mudança foram fatais. A crise interna e a derrota eleitoral não devem ser vistas como um fim, mas como um alerta para a necessidade de reestruturação. O partido precisa se reinventar, retomar o compromisso com a democracia interna e com a defesa dos interesses reais do povo moçambicano.

A Renamo ainda pode ser uma força política relevante, mas isso dependerá da sua capacidade de aprender com os erros recentes e agir com transparência e responsabilidade. O risco é o de um isolamento político cada vez maior, de um enfraquecimento que levará à perda definitiva do espaço conquistado com muita luta e sacrifício ao longo dos anos.

Se não houver mudanças estruturais profundas, o que resta será apenas assistir ao desmanche gradual da Renamo, com seus militantes desmotivados, suas lideranças desacreditadas e seu futuro cada vez mais incerto. O povo que confiava na oposição para uma mudança democrática legítima ficará órfão de uma alternativa real, e o ciclo de domínio da Frelimo continuará, com poucas perspectivas de alternância no horizonte.

Portanto, este momento exige reflexão séria e urgente. A Renamo não pode mais se permitir a arrogância de ignorar as vozes internas e externas que clamam por renovação. A derrota eleitoral não foi um acidente, foi a consequência de escolhas internas que contrariaram o clamor popular. O partido está na sala de reanimação e precisa urgentemente de uma transfusão de vida nova para não sucumbir.

Somente com um compromisso genuíno de mudança, com liderança renovada e transparente, e com um diálogo aberto com os seus militantes e eleitores, a Renamo poderá recuperar sua força e voltar a representar a verdadeira oposição que Moçambique necessita. Até lá, resta apenas o amargo reconhecimento de que os erros do passado recente custaram caro demais, e que o futuro depende de uma transformação que ainda está por vir, se houver vontade e coragem para isso.

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