Cartão Amarelo para Chapo: O que nos dizem As Mentiras da Verdade ditas por sua Excelência, o mais alto Magistrado, o Comandante em Chefe das FDSs

“As Viagens presidenciais a Metrópole e suas caricaturas- os homens se revelam quase sempre na diáspora: caso para dizer - Senhores Presidentes se forem a Portugal bebam vinho e não aceitem dar entrevistas, assim nos poupam da vergonha colectiva”
“Um presidente não mente. Um presidente representa. Quando mente, trai o povo. Quando finge, renega o mandato. Quando ignora o sofrimento dos seus, declara guerra ao futuro.”

Quando o presidente cai como patinho nas armadilhas da imprensa e comum que as pessoas façam seu julgamento, embora o presidente teria perdido uma soberana oportunidade de responder aquela questão simples com classe que se espera de um estadista honesto. Aceitar a crise social e ilegitimidade de seu governo não seria de todo tão mau, pelo contrario, seria a forma mais sensata de mostrar que esta ciente dos desafios que tem e do seu compromisso pela reconciliação e mostrar quais acções concretas pretende levar a cabo para a materialização desse desiderato. Entretanto, quis copiar a arrogância que caracteriza seus antecessores, especialmente o último que nos brindou com discursos lacónicos e tragicómicos que não faziam lembrar nenhum presidente nem no plano irracional.
Nesta semana, não podíamos tapar os olhos ao descalabro presidencial na diáspora, e concedemos o Cartão Amarelo da Semana ao Presidente Chapo, não apenas pelas suas palavras, mas pelo que estas silenciam. A entrevista concedida recentemente a uma televisão portuguesa também difundido em cadeia nacional pela televisão oficial do regime mostrou - nos uma narrativa fabricada, uma coerência retórica, cuidadosamente ensaiada, mas brutalmente dissonante com a realidade nacional.

Em várias passagens do seu discurso, o Chefe de Estado negou, categoricamente, a existência de uma sociedade moçambicana dividida, desvalorizou o clamor das ruas, relativizou as contestações eleitorais, e ainda tentou justificar o vazio nas celebrações dos 50 anos de independência comparando inclusive ao dia da proclamação da independência, mostrando ao mundo que o que todos viram não viram, não foi realístico, uma ilusão de óptica colectiva. Contudo, a ausência de multidões na Machava foi um grito silencioso do povo contra a hipocrisia política do regime e mais do que isso uma negação colectiva ao neo-  imperialismo.

A postura de Chapo naquela entrevista diz mais do que qualquer análise técnica poderia expressar. Foi um retrato da arrogância de um poder que se julga absoluto, acima da crítica, acima da verdade e, sobretudo, acima do povo.

Ao afirmar que "não há divisão" no seio da sociedade moçambicana, o Presidente pratica o negacionismo político. Nega a evidência gritante de uma fractura social alimentada por um processo eleitoral viciado, por uma governança centralizadora, por uma justiça instrumentalizada e por uma Força de Defesa e Segurança que, em vez de proteger o povo, se tem afirmado como um instrumento de repressão do regime.

Chapo não apenas nega as divisões: nega a dor. Nega a fome, nega o medo, nega as balas, nega as prisões arbitrárias, nega as centenas de mortos que já são memória viva de um Estado que perdeu o rumo e que se encontra refém da sua própria ilegitimidade.

É impossível ignorar o aparato de segurança que acompanha o Presidente nas ruas da capital. É uma imagem simbólica de um país sitiado por dentro, onde o poder não caminha mais ao lado do povo, mas entre muros de medo, em viaturas blindadas, cercado de soldados que, paradoxalmente, foram formados para defender o cidadão.

A verdade é que o Presidente sabe que o seu mandato foi obtido sob o signo da contestação. As ruas não mentem. As urnas foram violadas. Os mortos não falam, mas acusam. Mais de 500 almas tombaram para que Chapo pudesse ser investido. É um baptismo de sangue que o perseguirá durante todo o seu mandato, tal como um fantasma paira sobre um castelo construído sobre ossos.

As comemorações dos 50 anos de independência deveriam ser uma ocasião de união nacional. Mas tornaram-se num retrato triste do distanciamento entre o poder e o povo. A imagem do Estádio da Machava vazio foi mais poderosa do que qualquer discurso. Revelou o fracasso de um projeto de Estado que perdeu o contacto com os seus cidadãos.

Chapo tentou justificar a ausência das massas com desculpas irrealistas para não dizer mentirosas e infundadas. Mas o que ele não disse é que a Frelimo perdeu a sua alma popular e sua base social, rasgou seus desígnios e o povo não perdoou nem tampouco. Os estrategas de outrora foram substituídos por carreiristas e lambebotas, que não tem mãos a medir para mostrar serviço ao partido, matando através dos esquadrões da morte e demais meios coercivos. Os guardiões da moral partidária foram silenciados pelos algozes oportunistas. A corrida capitalista substituiu o ideal socialista. E, como resultado, o povo simplesmente não apareceu.

Outro ponto sensível da entrevista foi a tentativa do Presidente de apresentar uma imagem conciliadora. Falou em "avanços" no diálogo com a oposição, embora nenhum desses avanços tenha sido conhecido pela opinião pública. Falou de reconciliação nacional, mas negou o indulto aos jovens manifestantes que continuam presos sem culpa formada.

Enquanto isso, os que mataram, espancaram e torturaram em nome do regime continuam livres, em cargos públicos, acumulando riqueza, exibindo poder. Não há justiça. Não há igualdade. E, sem isso, não há paz.

O Cartão Amarelo vai também para o partido que sustenta este estado de coisas. A Frelimo, outrora partido libertador, parece hoje um corpo estranho, devorado pelo tempo, incapaz de se reinventar e profundamente desconectado da juventude e das periferias.

O conceito de "povo" para os actuais dirigentes é vago, selectivo, quase metafísico. Povo, para eles, é apenas aquele que aplaude, que venera, que obedece. Quem questiona, contesta ou desobedece é inimigo. E assim se vai erguendo um Estado sem nação.

Não se trata aqui de negar a investidura legal do Presidente. Trata-se de reconhecer que a legalidade, sem legitimidade, é vã. E a legitimidade, num sistema democrático, é dada pelo povo, não pelos tribunais nem pelos demais órgãos eleitorais.

Este Cartão Amarelo é um alerta. É uma tentativa de devolver a palavra ao povo, de afirmar que a verdade importa, que a memória das vítimas não será esquecida, que o futuro não pode ser construído sobre a mentira.

A história cobra. O povo observa. E os livros do amanhã estão a ser escritos hoje, nas praças, nos mercados, nas celas, nas trincheiras da opinião.

Presidente Chapo, este Cartão Amarelo não é um insulto. É um espelho. E, talvez, a última oportunidade de olhar para si mesmo com coragem.

Veja nossas noticas por categoria

Anuncie

aqui

Conversar

Ligue: +258 845 784 731