
Yonicio Silvio"
O direito de acesso à justiça, consagrado na Constituição da República de Moçambique, continua a ser um privilégio para poucos devido à grave crise de recursos que afecta o Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ). Esta instituição, encarregada de assegurar representação legal gratuita a cidadãos economicamente carenciados, enfrenta sérios desafios estruturais e financeiros que comprometem a realização da justiça social no país.
Embora o Presidente da República, Daniel Chapo, tenha manifestado o compromisso de modernizar o IPAJ e revisar a legislação que o rege, os problemas ultrapassam o campo normativo e refletem uma realidade mais profunda: a de uma “Justiça à Espera”. Em várias províncias, assistentes jurídicos trabalham em condições extremamente precárias, sobrecarregados com dezenas de processos, sem materiais básicos como papel, computadores, transporte ou mesmo energia elétrica. A falta de viaturas, de mobiliário adequado e de recursos tecnológicos transforma o atendimento jurídico gratuito num verdadeiro desafio, prejudicando a eficiência e a dignidade do serviço prestado.
Essas limitações têm consequências diretas na vida dos cidadãos. Muitos processos atrasam-se, vítimas ficam sem representação legal e há casos de pessoas detidas sem julgamento. A carência de meios também leva defensores públicos a custear, com recursos próprios, despesas de transporte e reprodução de documentos, numa tentativa de suprir as falhas do sistema. Além disso, a desvalorização dos profissionais do IPAJ refletida em baixos salários e falta de incentivos tem levado muitos a abandonarem a instituição, agravando ainda mais a escassez de recursos humanos.
O IPAJ depende quase exclusivamente do Orçamento do Estado, mas o financiamento público é insuficiente e irregular, resultando em dívidas operacionais e limitações no funcionamento das delegações. Para superar essa crise, propõe-se a adoção de um modelo de financiamento híbrido: reforço das dotações orçamentais, estabelecimento de parcerias com organizações internacionais como a União Europeia, PNUD e AECID, e a criação de programas de modernização e capacitação de recursos humanos.
Outras soluções viáveis incluem a cooperação com universidades para integrar estudantes e recém-licenciados em direito nas actividades do IPAJ, o que reduziria custos e proporcionaria formação prática. Além disso, o instituto poderia criar mecanismos de geração de receitas próprias, como a prestação de serviços jurídicos a entidades públicas e privadas, realização de formações pagas e implementação de taxas simbólicas em alguns serviços. A criação de um Fundo de Apoio ao Acesso à Justiça, sustentado por contribuições do Estado, doadores e empresas, surge como uma medida inovadora para garantir estabilidade financeira e ampliar o alcance da instituição.
Em síntese, a crise do IPAJ simboliza a fragilidade do próprio sistema de justiça moçambicano. Sem recursos materiais, humanos e financeiros adequados, a promessa constitucional de justiça para todos permanece distante. É imperioso que o Ministério da Justiça redobre os esforços de investimento e apoio às delegações provinciais, pois apenas com condições dignas de trabalho e valorização dos defensores públicos será possível transformar a “Justiça à Espera” numa justiça efetiva, acessível e equitativa para todos os moçambicanos.
2025/12/3
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