Paulo Vilanculo"
Historicamente os ciganos, referem-se a pessoas nómadas de uma comunidade em mobilidade constante que cruzam fronteiras, num tormento da rejeição institucional, de resistência à exclusão social, num forte encanto de apego à oralidade cultural, buscando espaço de dignidade e sua identidade. Uma "vida cigana", descreve uma existência instável, marcada por deslocamentos forçados, ausência de segurança e constante busca por pertença, ainda que envolta a força de resiliência e desejo de liberdade, em muitos casos, trata-se de uma resposta histórica à perseguição, marginalização e preconceito enfrentados por séculos.
Enquanto os ciganos percorrem terras à procura de aceitação e liberdade, não por mero capricho, mas pela histórica rejeição imposta pelos poderes instituídos, Singano, também se movimentou para a cidade da Beira, longe de representar apenas uma deslocação geográfica, ilustra uma travessia carregada de mistério em que, em vez de se deslocar como um homem político livre, a presença de Singano na Beira, foi vigiada, num país onde a linha entre crime e perseguição política é cada vez mais visível, sobretudo onde para quem ousar pensar diferente, o Estado, em vez de lhe responder no campo das ideias, parece optar por mecanismos obscuros de dissuasão, a detenção, cadeia ou desaparecimento, carregada de suspeitas vagas num padrão histórico de criminalização de opositores fora do eixo tradicional. Não é novidade em Moçambique que novos partidos e movimentos cidadãos que escapam ao controlo da lógica tradicional sejam perseguidos.
Singano é descrito por discursos não-alinhados, num país onde se teme o poder da palavra mais do que o da bala, a sua voz tornou-se insuportável para alguns. Desde que se anunciou como voz de oposição, com uma retórica provocadora, desafiando tanto o status quo quanto os pactos de silêncio dentro do sistema político moçambicano, Singano passou a ser visto mais como uma ameaça do que como um concorrente legítimo. Os seus discursos, inflamados, mas fundamentados, tocaram em nervos expostos da corrupção, impunidade, nepotismo e o desmantelamento da democracia real em Moçambique. De certo ponto, os seus cânticos, tanto em forma de discursos quanto de metáforas sociais, ameaçam justamente porque falam uma linguagem que o povo entende crua, directa e sem rodeios.
Depois da detenção insólita durante uma recolha “oficial” à cadeia, no episódio da sua detenção em contexto confuso, que já deixava no ar a sensação de que forças não declaradas operam para neutralizar a sua influência, Singano, como rosto visível e combatível tornou-se num alvo simbólico e estratégico. O mais recente capítulo ainda mais sombrio, que só reforça o espectro de um país disposto a tudo para silenciar vozes incómodas no destino resultou no seu rapto. Este rapto pode ser interpretado como uma mensagem contra a ousadia do Singano, pelo modo como se deu, a falta de prontidão das autoridades para esclarecer o caso, sem explicação pública convincente, e com silêncios cúmplices das autoridades, a ausência de conferências de imprensa e o silêncio ensurdecedor dos partidos históricos agravam a sensação de cumplicidade ou, no mínimo, negligência calculada, aponta para um acto com conotações políticas. Não se trata de um simples rapto comum, mas sim, pode se trata de uma tentativa clara de intimidação, silenciamento e desmobilização do projecto de Singano. Mais do que um ataque ao indivíduo, pode se trata de um aviso para os que ousarem desafiar os pactos de silêncio e corrupção.
A trajectória de Singano revela um país onde pensar fora do esquema é perigoso. Onde a democracia é mais um ritual do que uma prática. Onde os cânticos da esperança precisam ser murmurados para não acordar os fantasmas da repressão. O preço por sonhar em voz alta, em Moçambique, continua a ser um perigo. Singano agora paga com o próprio desaparecimento, talvez torturado por tempo indefinido, talvez silenciado. Singano está sendo viralizado não apenas como um político. Ele esta virando um símbolo de um inconformismo que foge aos modelos engessados pelos demais opositores que na sua luta se manifestam em alianças com Governo. No entanto, mesmo com o seu rapto, os cânticos ciganos de Singano persistem, nos murais, nas redes sociais, nas conversas clandestinas dos becos e vielas, onde se suspeita que a liberdade seja apenas uma palavra de campanha.
2025/12/3
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