
Paulo Vilanculo"
Segundo a DW, no dia 9 de outubro, MC Bandeira foi novamente alvo de uma emboscada durante a apresentação oficial do seu partido, um ato que, mais do que violência isolada, revela o desconforto de certas forças com a emergência de novas vozes políticas fora do círculo tradicional do poder. O episódio mais recente da tentativa de assassinato de David Bandeira, chefe nacional-adjunto de mobilização do partido ANAMOLA, reabre o debate sobre até que ponto o país vive um verdadeiro pluralismo político ou apenas simula uma convivência democrática para manter a aparência diante da comunidade internacional. O caso de MC Bandeira é apenas a ponta de um icebergue que denuncia o quão frágil é o exercício democrático quando a diferença de opinião se torna motivo de tentativa de eliminação física. Esta “guerra fria” moçambicana não é feita de tanques e bombas, mas de silêncios impostos, medos cultivados e estratégias de desmoralização pública.
Diante desse cenário inquietante, fica a pergunta que ecoa como um espelho da nossa própria humanidade: será que os moçambicanos viraram homens lobos de outros homens?
Este episodio lembra-nos o tempo dos massacres de junho de 1934 de oponentes de esquerda dentro do movimento nacional-socialista-nazista que consolidou sua reputação de violência bruta e gangsterismo, mesmo internamente controversos, que prejudicou seriamente a reputação do Estado. A campanha militar nazista também radicalizou os objetivos políticos do regime para em 1939-41, culminou no Holocausto, um esforço concentrado para exterminar fisicamente os inimigos nacionais percebidos, principalmente judeus. O genocídio fez cerca de onze milhões de vítimas, que representa apenas uma parte do número que a liderança nazi pretendia matar no estabelecimento da chamada Nova Ordem, principalmente em planos de fome deliberada em massa. Uma das compreensões iniciais mais prevalentes dos estudiosos marxistas argumentavam desde a década de 1920 que era uma forma de fascismo e, como tal, a defesa terrorista do governo capitalista contra as classes trabalhadoras revolucionárias, com culto à violência, o ultranacionalismo, a estetização da política e a liderança carismática de racismo biológico e campanha de genocídio na Alemanha nazista.
Em Moçambique, a violência política, as perseguições e o medo travestido de disciplina mostram que a democracia moçambicana vive cercada por lobos de terno e gravata. E é neste terreno pantanoso que a democracia se dissolve: quando quem devia garantir o direito à vida se torna o seu principal violador. A fronteira entre o Estado protetor e o Estado predador torna-se cada vez mais tênue e, no meio desse nevoeiro, o cidadão comum aprende a calar para sobreviver. O recente atentado contra David Bandeira, dirigente da oposição, revela o que muitos preferem negar: a liberdade política tornou-se um exercício perigoso. E quando o medo substitui o diálogo, a democracia deixa de ser um espaço de encontro e torna-se um campo de sobrevivência.
Que tipo de democracia é essa que teme a voz do seu próprio povo?
Moçambique vive um tempo estranho, em que a palavra “democracia” ainda é dita com orgulho, mas praticada com medo. Há um silêncio que pesa sobre o espaço público, um desconforto invisível que transforma o simples ato de pensar diferente num gesto de coragem. Há uma estranha normalidade que se instala quando o medo se torna política de Estado. Num país onde a palavra “democracia” é frequentemente usada como slogan, a realidade mostra um ambiente de intimidação política e medo disfarçado de estabilidade. Moçambique continua a vestir o traje de uma democracia formal, mas o corpo do seu sistema político parece padecer das feridas de uma guerra fria interna, silenciosa e traiçoeira. A cada novo partido que surge com pretensões de desafiar o status quo, repete-se o mesmo enredo: ameaças, perseguições, ataques físicos e sabotagens mediáticas.
A democracia está consagrada na Constituição, mas continua aprisionada nas mãos de quem a interpreta como um instrumento de sobrevivência política, e não como um compromisso com a liberdade e o bem comum. O pluralismo, que devia ser a força da democracia, passa a ser tratado como ameaça. A política deixou de ser o campo do debate e tornou-se um terreno de caça, onde a sobrevivência depende de fidelidades cegas e silêncios convenientes numa sociedade que se devora a si mesma, em nome da lealdade partidária ou do medo, já não precisa de inimigos externos, basta a sua própria indiferença. A oposição é vigiada, os críticos são desqualificados e os partidos emergentes, enfrentam a sombra da repressão disfarçada de “segurança nacional”. O discurso oficial fala de paz e reconciliação, mas a prática política mostra um terreno minado de intolerância e exclusão. Moçambique, enquanto a sociedade for condicionada a temer quem pensa diferente, continuará a ser um país formalmente democrático, mas substancialmente em guerra fria com vítimas reais, invisíveis e silenciadas, ai, o Estado perde a sua face humana e ganha a de um predador. Quando a democracia tem medo de si mesma, ela passa a desconfiar dos seus próprios cidadãos: vigia-os, cala-os, pune-os. Os que obedecem são recompensados, os que questionam são silenciados. O cidadão comum aprende a calar para não desaparecer, e o Estado acostuma-se a governar sem ser questionado. Assim, a democracia vive, mas sobrevive à custa da sua própria essência, o direito de ser diferente.
2025/12/3
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