
Paulo Vilanculo"
Moçambique vive um dos seus momentos mais paradoxais de sucessões de escândalos financeiros e políticos que corrói, como roedores, as bases do Estado, enquanto as principais figuras do poder assistem em silêncio, como atores de um filme mudo de Charlie Chaplin. O que os factos revelam é que os sucessivos escândalos financeiros, longe de serem episódios isolados, fazem parte de uma engrenagem política que se instalou como cultura de governação. Rombo após rombo nos cofres públicos confirmam a persistência de um sistema de saque ao Estado. Mas a questão que se levanta é: a corrupção generalizada e os rombos milionários não configuram motivo suficiente para uma intervenção urgente e firme do Conselho do Estado, o que mais justificaria a sua existência?
Moçambique atravessa um período em que a política e as finanças se confundem com um filme mudo de Charlie Chaplin. Enquanto rombos milionários se multiplicam nos cofres do Estado, os protagonistas da cena nacional reagem com expressões ensaiadas, mas sem voz, sem palavra, sem explicação. O país vive o tempo dos roedores, agentes da corrupção que, em silêncio, corroem as estruturas da República, tal como ratos que atacam um celeiro. O título “Moçambique e o tempo dos roedores Ministeriais de Chaplin” evoca os “Roedores” saqueadores do erário publico, os que corroem silenciosamente as estruturas e simbolizam a corrupção do Estado moçambicano. O “Chaplin” remete-nos ao cinema mudo, à ideia de palhaçada, sobretudo, de uma comédia trágica em que todos assistem, mas ninguém fala, tal como o silêncio cúmplice de quem é e com o direito de instancar o filme mudo que se vive, onde a corrupção atua como “roedor” incansável, e a liderança prefere encenar uma comédia em vez de enfrentar o drama real que ofusca o povo.
Circula nos bastidores um novo “despoletar” de rombos milionários nos cofres públicos do Ministério das Finanças. Os cofres do Estado, em vez de servirem ao desenvolvimento, tornaram-se a fonte de enriquecimento ilícito de poucos, enquanto a maioria dos moçambicanos sobrevive em condições precárias. O Ministério das Finanças, que deveria ser guardião do erário público, converteu-se numa arena de saque institucionalizado. No lugar da disciplina orçamental e da gestão transparente, reina uma lógica de pilhagem em que a elite política e empresarial age como se estivesse num banquete interminável. A cada manchete, a sensação é a de que se trata de mais uma revelação escandalosa. Cada desfalque, cada “rombo milionário”, não só esvazia o tesouro do Estado como esvazia também a confiança do povo no futuro e abre ainda mais espaço para a dependência externa, das instituições financeiras internacionais e de interesses estrangeiros que sabem negociar com governos frágeis e corroídos pela corrupção. O mais alarmante é que estes saques não são apenas um problema de gestão financeira, mais do que uma questão financeira, os sucessivos escândalos são um problema de soberania nacional. A confiança popular nas instituições degrada-se, alimentando a apatia social e a descrença num futuro coletivo.
A verdade é que, desde a colonização até ao governo do partido único pós-independência, a lógica da exploração manteve-se intacta: apenas mudou de mãos. No entanto, a leitura mais honesta aponta para outra realidade: não estamos diante de descobertas súbitas, mas da confirmação de um rombo estrutural desta “décima parte” da governação do partido libertador em Moçambique transitada e persistente, que remonta aos 500 anos de colonização. A indignação social, por sua vez, vai sendo abafada por uma comunicação social controlada, por discursos inflamados de unidade e patriotismo e, sobretudo, pelo medo que ainda reina nos corredores da sociedade sobre a ausência de responsabilização efetiva torna os escândalos meros episódios mediáticos, rapidamente substituídos por novos “rombos” que seguem o mesmo guião: denúncia pública, indignação passageira e silêncio conveniente. A comunicação social, muitas vezes é capturada por interesses políticos, limitando-se a noticiar os casos sem oferecer o devido aprofundamento ou seguimento.
Ao lado desse silêncio, ecoa a inoperância da própria Assembleia da República. Assistir a sucessivos escândalos sem reagir, sem exigir responsabilidades, o que não é neutralidade, é conformação. O silêncio revela um preconceito político enraizado da crença de que não é necessário reformar o governo e o Estado, apenas administrar a crise com paliativos. Esse silêncio, ensurdecedor, alimenta a impunidade e transmite ao povo a mensagem de que os roedores podem continuar a devorar, porque nada acontecerá. Mais grave ainda é o silêncio do Conselho do Estado. O silêncio do Conselho de Estado transforma-o num símbolo de inoperância institucional. O órgão, concebido para aconselhar o Presidente da República em matérias de interesse nacional, permanece invisível diante da maior crise de confiança e de credibilidade que o país atravessa, tornou-se um órgão fantasma. O problema é que, perante a “pandemia política e financeira” que assola Moçambique, o Conselho parece mudo. O seu silêncio, transforma-o num eco vazio da democracia moçambicana que existe apenas para legitimar a aparência democrática, mas não para defender o povo nem confrontar o poder. No peso simbólico, o “silêncio adormecedor” transmite a ideia de algo que existe apenas no papel, mas sem presença, sem ação real, inoperante, sem efeito prático, um “eco vazio da democracia moçambicana” que não passa de um som oco, que apenas repete a formalidade democrática sem conteúdo.
Ao deixar de cumprir a sua função de contrapeso e de guia moral, o Conselho de Estado legitima, ainda tacitamente, a continuidade do saque institucionalizado de uma verdadeira pandemia política e financeira que o pais atravessa, onde a corrupção funciona como vírus que corrói as bases do desenvolvimento da maioria dos moçambicanos que continuam a enfrentar crises de: emprego, saúde e educação precária, numa elite política e financeira que opera como se estivesse num banquete interminável, repartindo contratos, desviando fundos e perpetuando uma lógica de pilhagem que mina qualquer esperança de desenvolvimento sustentável. Enquanto não houver reformas estruturais e coragem política, Moçambique continuará a ser palco de filmes repetidos, um tempo dos roedores sem desfecho, em que o povo moçambicano, mais uma vez, fica sem voz nem defesa no topo do aparelho estatal, forçados aos aplausos, sem nunca tem nenhum direito, assiste a consolidação de uma governação que prioriza o mel das elites e não o pão das maiorias.
O Chaplin, no cinema mudo, fazia rir, mas na nossa realidade, o silêncio faz chorar. A diferença é que, na tela moçambicana, não há humor que alivie se não apenas a corrosão lenta da esperança nacional. No fim, a pergunta permanece: até quando o país continuará a viver sob o guião da comédia trágica dos roedores de Chaplin? O Ministério das Finanças, longe de ser guardião do tesouro público, converteu-se na caixa-forte dos gánsters de gravata. A imagem é chaplinesca dilui-se na massa popular que assiste à comédia, mas sofre a tragédia. Se os rombos persistirem, se as descobertas forem apenas notícias passageiras e se não houver mudanças efetivas, então continuará a vigorar a lógica de que o Ministério das Finanças não é a casa do povo, mas a caixa-forte do governo dos gánsters.
2025/12/3
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