Informe à Nação: Chapo entre discurso de aplausos num futuro sombrio das realizações sociais

Paulo Vilanculo"

 

Num país marcado por incertezas económicas e fragilidade social, o Informe à Nação não pode limitar-se a abstrações políticas ou promessas de futuro, devia, acima de tudo, responder às angústias imediatas do povo da como irão os moçambicanos atravessar as quadras festivas. Neste contexto, o Presidente falou e não respondeu as espectactivas reais da sociedade e isso instala a dúvida, se será que o Presidente governa relatórios ou o povo? Num momento de aperto social, quem deve falar para o povo, são mais tarde os ministros administradores ou a cabeça do Estado que governa, o Presidente? o Presidente Chapo não falou, de forma concreta, sobre como vai melhorar a educação em Moçambique? De forma ainda mais objetiva, a Função Pública receberá os seus salários atempadamente, incluindo o décimo terceiro vencimento?

Depois de longas e sucessivas aparições internacionais no seu primeiro ano de mandato, muitas delas marcadas por discursos de afirmação diplomática e busca de legitimidade externa, durante meses, o poder foi centralizado na figura presidencial, o Presidente da República fez, finalmente, a sua primeira grande aparição pública interna através de um aguardado Informe à Nação. O momento simbólico do Informe à Nação virou num silêncio ensurdecedor sobre as matérias da sociedade neutral. Num momento que, pela sua solenidade constitucional e simbólica que deveria representar um balanço honesto da governação, uma radiografia do estado da economia e, sobretudo, um compromisso claro com as urgências sociais do povo moçambicano, no entanto, o discurso presidencial revelou-se paradoxal.

O Chefe do Estado optou por um registo discursivo confortável, ancorado numa narrativa genérica de “governação inclusiva”, um conceito politicamente atraente, mas perigosamente vazio quando não sustentado por políticas públicas concretas, de metas mensuráveis e resultados verificáveis. Num contexto de inflação persistente, precarização do emprego e crescente informalidade, o silêncio sobre o PIB não é apenas uma omissão técnica: é um sintoma de desconexão entre o discurso oficial e a realidade vivida nas ruas. A ausência de referências claras ao desempenho económico do país levanta interrogações legítimas.

A educação é simultaneamente vítima e causa do subdesenvolvimento, o silêncio técnico sobre este setor não é um lapso menor é um sinal político. O discurso presidencial limitou-se a referências genéricas ao setor da educação, encaixadas numa retórica ampla de governação inclusiva e desenvolvimento humano, sem apresentação de um plano claro, metas verificáveis ou compromissos orçamentais concretos. Não se ouviu falar de reformas curriculares profundas, valorização efetiva da carreira docente, combate sério à precariedade das escolas públicas ou estratégias para reduzir o abandono escolar, sobretudo nas zonas rurais. Melhorar a educação exige mais do que intenções: exige decisões difíceis, investimento sustentado e coragem para enfrentar sistemas viciados, desde a corrupção administrativa até à desvalorização do professor.

Num país fatigado por promessas adiadas, o povo não exige discursos perfeitos, mas verdades difíceis e ações consequentes. Porque a verdadeira governação inclusiva não se proclama: constrói-se, mede-se e sente-se no prato de comida, no emprego garantido e na dignidade restaurada do cidadão comum. Quando o Chefe do Estado se dirige à Nação, fala não apenas como coordenador político, mas como garante último do funcionamento do aparelho estatal. No apanágio nacional, o Presidente É quem concentra a legitimidade para assegurar que o salário do funcionário público não falhará, que o décimo terceiro será pago ou, se não for possível, explicar com frontalidade as razões e assumir o custo político dessa verdade. Delegar esse esclarecimento aos ministros é transformar uma questão de Estado num problema de secretaria.

O Presidente esteve em todo o lado, cortou fitas, anunciou programas, prometeu soluções e assumiu o protagonismo absoluto da governação. Os ministros foram, nesse processo, progressivamente reduzidos a gestores de bastidores, executores silenciosos de uma agenda que tinha rosto único. Criou-se a imagem do Presidente-onipresente, do chefe supremo de todos os dossiês, do decisor final até nas matérias mais técnicas. Num país em que a maioria da população é jovem, ignorar este drama social equivale a adiar o futuro. O desafio do desemprego, particularmente entre os jovens e recém-formados, também ficou relegado ao plano secundário. A juventude não se alimenta de discursos, mas de políticas ativas de emprego, de investimento produtivo e de um Estado que funcione como catalisador do desenvolvimento, e não como mero gestor de retórica política.

Num Estado funcional, o Presidente fala para fechar ciclos, não para abrir esclarecimentos posteriores. A ironia é evidente. Quem se canonizou como chefe de todos os ministérios não pode, no momento da prestação de contas, comportar-se como mero coordenador simbólico. Em vez de enfrentar com frontalidade os indicadores que mais inquietam a sociedade, como o crescimento económico medido pelo PIB, o agravamento do desemprego juvenil e a ausência de um projeto estruturante de melhoria efetiva das condições de vida, ao empurrar um segundo “informe” para ministros sem densidade política própria, o Presidente fragiliza a autoridade do seu próprio discurso. Transforma o Informe à Nação num prefácio inacabado e os ministros em intérpretes de uma partitura mal definida. Não é descentralização institucional; é fuga ao compromisso político direto.

Quando o Chefe do Estado fala e os ministros precisam de voltar a falar, algo falhou na liderança. Entre a esperança anunciada e as realizações concretas, instala-se um hiato perigoso ente aquele em que a confiança popular se esvai e o desencanto se aprofunda.E quando o povo percebe essa falha, compreende que o problema não está nos ministros que explicam demais, mas no Presidente que explicou de menos, porque governar não é apenas inaugurar. Governar, afinal, não se faz apenas com promessas de inclusão, mas com a criação de oportunidades reais, trabalho digno e justiça social palpável, num discurso cuidadosamente polido, mas carente de densidade social; politicamente correto, porém socialmente insuficiente. Governar, é sobretudo, assumir. O Informe à Nação acabou, assim, aparece mais um exercício de aplausos projetados para um futuro indefinido do que uma prestação de contas sobre o presente.

2025/12/3