Chiveve em “mussodji”, Carige dá último adeus ao artista “Xavier Tepo” e um abraço de fortalecimento aos músicos moçambicanos

Paulo Vilanculo"

O dia 27 do mês de Setembro, a cidade da Beira mergulhou se em luto com a morte de Xavier Tepo, fundador e vocalista principal da banda Mussodji, no Chiveve, cidade da Beira. Recordar que a Casa de Cultura do Aruangua tornou-se espaço de encontro, onde novos talentos onde foram descobertos e encorajados. Mussodji, em língua Ndau na região central da que significa “lagrimas”. A Banda Mussodji surgiu seguindo as pegadas mais enraizadas depois dos Rastilhos e Djakas. Na década de 2000, num projecto musical e artístico levado a cabo pela casa provincial da cultura, berco de diversos fazeres do mundo artístico, um júri composto por Paulo Vilanculo - Vilas (artista), Dionísio (baterista), Jorge Mamade (músico e compositor), Estêvão Ucama (o maestro-instrumentista), Tony Camacho (produtor), entre outros que, assumiram o papel de avaliar e classificar bandas emergentes, abrindo portas para que jovens artistas unidos por Xavier Tepo firmassem a banda Mussodji, a banda Nhacha e muitos artistas na arena musical Nacional e internacional. Esse legado não se limita ao passado. Este gesto reafirma a importância da partilha e da continuidade do legado musical na cidade em movimento, germinando novas gerações que procuram ocupar o palco da vida cultural da Beira e a ponte entre passado e futuro, enquanto nos despedimos de um ícone, reafirmamos o compromisso de fazer florescer a criatividade na Beira, garantindo que a música continue a ser um instrumento de identidade, unidade e esperança. A notícia do seu desaparecimento do músico, vítima de doença, deixa um vazio irreparável na música moçambicana, mas também um legado que resiste, feito de ritmos e poesias que traduziram o espírito do Chiveve e ecoaram muito além das fronteiras da cidade. A partida física do músico, representa uma perda irreparável para a cultura local e nacional, deixando órfãos não apenas os companheiros de palco, mas também todos os que encontravam no seu timbre e nas suas letras uma forma de resistência, identidade e celebração da vida. O silêncio de Xavier Tepo transformou-se em “mussodji”, um lamento em uníssono, onde familiares, fãs e colegas de profissão uniram-se para prestar a última homenagem ao artista que fez da música um espelho da alma beirense. A dor da despedida foi acompanhada por um gesto de fortalecimento do edil da Beira, Albano Carige, juntou-se à a família e a comunidade artística para dar o seu último adeus a Tepo e endereçou um abraço solidário aos músicos da Beira, incentivando os artistas a manter acesa a chama da criatividade e a resistência cultural que Tepo representava. O edil, lembrou o papel ímpar do malogrado na valorização da música popular e no enaltecimento da identidade cultural de Sofala. Em declarações, Carige sublinhou ainda que Xavier Tepo foi mais do que um músico, mas sim, foi um guardião da memória coletiva, que soube transformar dores, alegrias e esperanças em melodias que hoje pertencem a todos, recordando-o como um pilar da cultura local. Salientar que o edil da Beira tem abraçado diversas iniciativas artísticas beiresnses, destacando se o acolhimento de muitos talentos sofalenses como colaboradores nos serviços municipais da cidade da Beira. Para muitos, esse gesto foi visto como um chamado à continuidade, um compromisso com a preservação da identidade artística da cidade, tantas vezes esquecida, mas sempre resiliente. No coração do Chiveve, onde os sons da música sempre acompanharam as dores e alegrias da cidade, ecoa agora o silêncio de um “mussodji” coletivo, um lamento de todos aqueles que viam em Tepo um artista e guardião da memória cultural. As suas canções, que narravam vivências, esperanças e resistências, foram neste dia transformadas em cântico de despedida. Foi a voz de uma geração e continuará a ser a inspiração para muitas outras. A Beira perde um filho, mas herda um legado que deve ser preservado” “É um dia de luto para a cidade da Beira. Além de ser um ícone da música local, Xavier Tepo também abriu caminhos para o surgimento de novas gerações artísticas. Perdemos um dos nossos melhores, mas fica o legado que não se apaga”, afirmou. O abraço solidário de Carige aos músicos locais traduz o reconhecimento de que a cultura é o coração pulsante da cidade e que figuras como Xavier Tepo não desaparecem; transformam-se em eternidade, inspirando cada acorde e cada nova voz. Por outro lado, o desaparecimento físico de Tepo trouxe à tona uma contradição amarga que revela que os artistas que dão rosto, voz e identidade à cultura moçambicana são frequentemente celebrados apenas na hora da morte, mas em vida lutamos contra a falta de apoios, um abandono por parte das políticas culturais. Em vida, Xavier Tepo, como tantos outros músicos, enfrentou as mesmas dificuldades que marcam a trajetória de quem ousa viver da arte em Moçambique: falta de políticas públicas consistentes, ausência de financiamento, esquecimento das instituições e um sistema que marginaliza a cultura. Xavier Tepo, carregou sobre os ombros o peso de manter viva a chama cultural do Chiveve, num país onde a cultura é tratada como um apêndice dispensável. Xavier Tepo simboliza um capítulo de resistência e criatividade, mas também denuncia, com a sua morte, o silêncio cúmplice do Estado perante a cultura. É tempo de transformar a dor em grito dizendo que “não basta chorar os músicos quando partem, é preciso honrá-los em vida, criando condições para que floresçam”. No entanto, a verdade é dura, a promoção cultural em Sofala e na Beira não deve ser sustentada apenas com boa vontade, mas sim. precisa de investimento real, de reconhecimento político e de prioridade nas agendas governativas que têm deixado a cultura local à deriva, sobrevivendo mais pela paixão dos artistas e da comunidade do que por apoio institucional. Não podemos continuar a chorar artistas apenas quando partem, enquanto em vida enfrentam abandono e indiferença. Não é admissível que artistas que carregam a bandeira da identidade nacional morram na pobreza, no esquecimento ou na solidão. Não é aceitável que espaços culturais sobrevivam mais pela paixão de uns poucos do que pelo compromisso das instituições. Não é justo que a juventude talentosa continue a ser negligenciada enquanto busca no palco um caminho de dignidade. Hoje, o Chiveve chora. O desaparecimento de Xavier Tepo é, sim, uma perda que deixa um vazio difícil de preencher e simboliza tanto uma perda como um chamado, um grito de alerta a valorização da arte e cultura em vida, ou enterramos a cada artista e pedaços da nossa própria história, ou eternizamos a voz, marcada pelo ritmo e pela poesia, o ritimo do Ndau a mistura das danças “Ndokodho e utse-sena” do “chamari…chamuari”- amigo que partiu na sua “Kanghala”- jangada que, Xavier Tepo ironicamente como adivinha do futuro afirmava: “nhassi a wu y wani, kanghala, xamuari wee…” - que hoje não apanharás a (minha) jangada amigo irmão. Certamente que jamais apanharemos juntos a jangada do Xavier Tepo e também jamais será de Mussodji, ela estará nos nossos corações, como colegas artistas que continuam em navegação e Xavier Tepo continuará a ser um farol para novas gerações de músicos e admiradores. Enquanto isso, na base, a chama cultural da Beira tem sido mantida por quem não desiste, a Casa de Cultura do Aruangua transformou-se em palco de resistência, espaço onde se apostou na descoberta de novos talentos e no apuramento de novas bandas onde renascem a cada nova voz que se ergue nos bairros, a cada acorde que ressoa nas praças, a cada jovem que acredita ser possível fazer da arte um caminho de dignidade. Entre lágrimas e aplausos, a Beira despediu-se de um filho que mesmo nos momentos mais difíceis nunca abandonou o seu povo, transformando alegrias e sentimentos em poesias e dança. Contudo, é preciso transformar o luto em ação, lutando para que a cultura deixe de ser vista como apêndice e passe a ocupar o centro da vida política e social, cantando em coro para dizer “Xavier Tepo não partiu, apenas se transformou em música eterna e deixou-nos o dever de não deixar morrer a cultura”.

2025/12/3