A GALA DE FADA DO GABINETE DA PRIMEIRA DAMA PARA MULHERES DA ELITE MOÇAMBICANA

Paulo Vilanculo "

Moçambique atravessa, nas últimas décadas, uma crise social profunda marcada por altos índices de pobreza, desemprego, desigualdade de gênero e vulnerabilidade das populações rurais. Em especial, as mulheres continuam a carregar o peso da exclusão social, apesar de serem agentes centrais na sobrevivência familiar, na produção agrícola e na coesão das comunidades. Em contraste com esta realidade, o Gabinete da Primeira-Dama realizou recentemente uma gala luxuosa para homenagear mulheres de "elite urbana", num gesto que reacende o debate sobre a desconexão entre as esferas do poder político e as bases populares. Esta análise pretende problematizar a natureza seletiva do evento e discutir seus impactos simbólicos e políticos na luta por igualdade de género e justiça social em Moçambique. Utilizando referenciais teóricos sobre desigualdade social, justiça e representação, o artigo propõe uma reflexão sobre o simbolismo dessa iniciativa e os riscos de se reforçar uma narrativa elitista em detrimento da inclusão social.

 

A gala promovida pela Primeira-Dama foi apresentada como um símbolo da celebração da mulher moçambicana, da elite urbana, empresárias, figuras da televisão, mulheres do meio político e social, etc. O evento foi revestido com pompa e glamour mas com exclusividade e restrição de desconsideração da realidade vivida por milhares de mulheres moçambicanas, sobretudo camponesas, que sustentam a economia informal, enfrentam a pobreza extrema e a marginalização estrutural.

A ausência da mulher camponesa, da vendedeira informal, da mãe solteira e batalhadora dos bairros periféricos revela não apenas um vazio representativo, mas também a perpetuação de uma lógica excludente de poder. A ausência desta sensibilidade é um sinal de um projeto político elitista que vê a mulher empoderada apenas como aquela que alcançou sucesso dentro dos moldes do capitalismo urbano. Ao ignorar este segmento essencial da população, o evento revela-se uma encenação política voltada à autopromoção e à manutenção de uma imagem de sucesso associada ao poder.

Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), mais de 60% das mulheres moçambicanas vivem em áreas rurais e dependem da agricultura de subsistência. Estas mulheres enfrentam obstáculos múltiplos: baixos níveis de escolaridade, acesso precário à saúde, violência doméstica e marginalização institucional. No entanto, elas não foram sequer mencionadas nos discursos oficiais da gala. Eventos como este reforçam a chamada "solidariedade seletiva", conceito discutido por Nancy Fraser (1997), no qual se presta reconhecimento apenas a um grupo privilegiado, enquanto outros são silenciados. Em Moçambique, esta dinâmica é agravada pelo contexto pós-colonial e neoliberal, onde as políticas públicas raramente priorizam a inclusão real das mulheres pobres.

Embora são Competências do Gabinete da Esposa do Presidente da República: realizar iniciativas de carácter social ou cultural que ela decida desenvolver no âmbito das suas competências oficiais e as demais competências que forem determinadas pela Esposa do Presidente da República (Artigo 18, b, c). A socióloga Silvia Federici (2004) argumenta que a invisibilização do trabalho reprodutivo das mulheres e sua exclusão dos espaços de prestígio são pilares da opressão de gênero na modernidade. A Primeira-Dama, enquanto figura simbólica do cuidado e da maternidade nacional, poderia ter adotado uma abordagem mais inclusiva, celebrando a pluralidade da experiência feminina em Moçambique. Deve se fazer uma reflexão sobre como a elite política pode incluir as mulheres mais vulneráveis em Moçambique e uma chamada à Ação de um apelo para que o governo e outras entidades promotoras de eventos sociais repensarem suas prioridades e adotem abordagens mais inclusivas.

 

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Recordar que a Primeira-dama de Moçambique tem algumas iniciativas ambiciosas, por exemplo, a esposa do Chefe do Estado tenciona criar centros abertos de acolhimento para crianças que necessitam de apoio, sobretudo nas localidades e nos distritos com centros de acolhimento específico. Gueta Chapo, garante que o seu gabinete vai mobilizar recursos junto aos parceiros para a criação de um centro de acolhimento aberto para acolher crianças com necessidades especiais. (AIM, Maputo, 14 Fev 2025).

Amartya Sen (1999) afirma que o desenvolvimento não pode ser medido apenas por índices econômicos, mas pelo aumento das liberdades reais dos indivíduos. Neste sentido, celebrar o sucesso de uma minoria sem investir na ampliação de oportunidades para todas as mulheres é uma prática antagônica à justiça social. Na Crise Social das Mulheres em Moçambique, no contexto da situação socioeconômica das mulheres em Moçambique, o foco está nas condições das mulheres camponesas, rurais e desfavorecidas, que apresentam elevada Pobreza e Desigualdade Social, olhando a Mulher Camponesa e o seu Papel, o papel da mulher na agricultura, com desafios como a falta de recursos, acesso a crédito, educação e saúde, bem como a marginalização social.

A falta de Inclusão das Mulheres Desfavorecidas, pode se configurar em:

  • A Falta de Representatividade como Injustiça Social: em que devia se focar no conceito de justiça social e na necessidade de políticas públicas que favoreçam as mulheres em situação de vulnerabilidade, ao invés de eventos que apenas reforçam a divisão entre classes.
  • Propostas para a Inclusão Real: devia apresentar boas sugestões das políticas públicas de eventos mais inclusivos, com foco na visibilidade e oportunidades às mulheres que realmente representam a base da sociedade moçambicana e não apenas as da elite letrada.

Em ultima análise de Classe, a Gala da Primeira-Dama, representou:

  • Exclusão Social e Elitismo: o evento promovido pela Primeira-Dama, pode ser visto como um símbolo de elitismo e desconexão com as necessidades da maioria das mulheres.
  • Impacto na Percepção Pública: devia se entender a crítica pública ao evento e a reação da sociedade civil, incluindo movimentos feministas e organizações sociais, que podem questionar a ausência de mulheres camponesas ou aquelas em situações de vulnerabilidade.

Concluímos afirmando que a gala promovida pelo Gabinete da Primeira-Dama, sob o manto da valorização da mulher moçambicana, acaba por reforçar uma narrativa elitista e excludente, alheia à dura realidade vivida por milhões de mulheres que sustentam o país com seu trabalho invisibilizado. Em vez de ser um espaço de reconhecimento plural, o evento tornou-se uma vitrine de privilégios, marcada pela ausência das verdadeiras heroínas anônimas do país. É imperativo que as instituições públicas repensem suas práticas simbólicas e políticas, de forma a incluir todos, sobretudo aqueles que são sistematicamente silenciados.

2025/12/3