A pedagogia científica como método para a ciência

Mudjadjo"

Uma pedagogia científica é antes de tudo uma pedagogia do pensamento e assim, estará inserida em dupla perspectiva: a educação, entendida como uma prática filosófica, histórica e social e uma perspectiva crítica. Tais reflexões encaminham para a articulação epistemologia / pedagogia científica e para a compreensão da pesquisa como uma actividade criativa e crítica de produção de novos conhecimentos. Para Freire (2005: 27) “Devemos ter uma nova articulação entre tecnologia e educação, aquilo que chamaríamos de uma visão crítica, ou seja, compreender a tecnologia para além de um mero artefacto, recuperando sua dimensão humana e social”. Desse processo, deve resultar a compreensão do fazer científico, da prática interdisciplinar, da articulação teoria/prática e do aprendizado integrando pesquisa/ensino no processo de produção do conhecimento. Dessa forma, o professor ou orientador exerce dupla função pedagógica: a de ensinar e pesquisar, e a de aprender e ensinar. Ambas são actividades interligadas. Segundo Gaston Bachelard, a epistemologia e pedagogia se entrelaçam para formar um pensamento orgânico, que se renova e não se conforma com as impressões primeiras, e com os dados do senso comum e da apreensão da realidade por meios não científicos. A relação pedagógica implica interacções humanas e psicológicas, de confiança e de respeito intelectual. Desenvolve-se a partir do interesse do professor no crescimento intelectual, moral, ético e científico do aluno e como assinala Bachelard, um desejo que o aluno possa superar o mestre. Todo o mestre deve formar seus discípulos, mas para tal o aluno deve ter boa capacidade de questionamento. A educação carece da dimensão crítica, que aos poucos, está se perdendo devido à racionalidade, à burocracia académica, ao controle pelo controle de um saber instrumental prático e pouco estimulante do ponto de vista intelectual. A vida académica e a intelectual necessitam de predisposição afectiva e, ao mesmo tempo de uma inquietação permanente, de uma imaginação crítica e reflexiva. A dificuldade e a discussão fazem parte do dinamismo psicológico da pesquisa científica, e não só da pesquisa, mas também da pedagogia da ciência. Tanto o trabalho científico da pesquisa, quanto o do seu ensino exigem que os pesquisadores e os educadores criem dificuldades para si próprios. O importante é que saibam criar dificuldades reais e eliminar os obstáculos falsos ou as dificuldades simplesmente imaginárias; os educandos devem sentir uma espécie de apetite pelos problemas difíceis O dogmatismo desconstrói toda a criatividade e gera uma paralisia mental. O professor na prática pedagógico-científica, pode ser muito menos alguém que ensina e mais alguém que desperta, estimula, provoca, questiona e se deixa questionar. Tal atitude permite estabelecer relações pedagógicas colaborativas, abertas e construtivas. A ambiência afectiva e pedagógica estimulará com certeza, o aluno a criar, criticar, produzir, inovar, pesquisar, etc., a pedagogia formativa pressupõe formação científica e vocação para a ciência. Tais pressupostos implicam mudança de cultura na prática científica e nos processos pedagógicos, de forma a tornar o pedagógico mais científico, e este mais pedagógico. Nessa perspectiva, a prática pedagógica deve reflectir a prática científica e vice-versa. Segue-se que tornar o científico mais pedagógico significa utilizar formas de pedagogia que situem os alunos como sujeitos críticos, que problematizem o conhecimento, que lancem novas questões, gerando novos desafios e novas questões-problemas-soluções, rectificando a ciência e os métodos científicos. Para a ciência e o espírito científico, todo o conhecimento representa uma resposta à uma dúvida ou questão. É o sentido da dúvida e do problema que dá a marca do verdadeiro espírito investigador. Se não existir problemas, não há respostas. A pedagogia científica que aqui se fala procura estimular no aluno a capacidade de inquietar-se, de colocar sempre novas questões e de estar em permanente estado de inconformismo com o conhecido, com a ciência dita normal e com o conhecimento estabelecido, pois, para a ciência, a opinião representa uma desconstrução. O pensamento científico é também um pensamento político: remete ao uso, ou seja, à utilidade social da pesquisa. Assim, uma política de pesquisa deverá ser também uma política social. O carácter multidisciplinar amplia a formação do aluno e o exercício do pensamento complexo, permitindo estabelecer diálogos teórico-metodológicos mais apropriados à produção de conhecimento. No entanto, para pensar no ensino articulado à pesquisa, torna-se necessário reverter a lógica do ensino tradicional e integrá-lo à lógica da pesquisa. Integrar ensino e pesquisa pressupõe uma nova relação com o aluno e uma nova condição de ensino. O aluno é o centro da acção pedagógica. Ele deve produzir, reflectir, observar, indagar e essencialmente adquirir formação e acções básicas de quem investiga. Deve-se colocar à cultura científica em estado de mobilização permanente; substituir o saber fechado e estático por um saber mais dinâmico e aberto, oferecendo enfim, a razão motivos para evoluir. Este processo pedagógico poderá contribuir para o aluno desenvolver sua própria autonomia intelectual, tornando-se um intelectual independente, capaz de assumir atitudes científicas no seu futuro profissional. A discussão da pedagogia científica e das bases epistemológicas que a constitui tem como objectivos reflectir sobre a prática da pesquisa e apresentar referenciais para discutir sobre uma nova pedagogia. Assim, é de fundamental importância desenvolver práticas e metodologias que levem o aluno a pensar criticamente; a desenvolver sua própria autonomia intelectual; a desenvolver uma atitude de busca, de aprender num processo contínuo a partir de um pensamento dialectizante; a utilizar conceitos e novas elaborações, como instrumento de construção e reconstrução de novos saberes. Bachelard apela por uma razão aberta; por uma nova comunicação pedagógica, por uma escola contínua ao longo da vida; por uma educação permanente; e por uma pedagogia do descontínuo e da incerteza.

2025/12/3