
Luís Munguambe Júnior"
Passaram cinquenta anos desde a independência, mas em Moçambique não nasceu uma elite para libertar o povo — nasceu uma elite para mandar nele. Uma casta de “Senhores Doutores” que ostentam diplomas como medalhas, mas que, no fundo, são apenas repetidores aplicados da mesma lógica que nos colonizou.
Samora, lá em 1975, avisou na Beira: viriam camaradas a erguer prédios de 15 andares, sem nunca explicar de onde saiu o dinheiro. Não se enganou. Hoje os prédios estão de pé, os carros blindados circulam, as contas em Dubai crescem, e o povo continua em casas de chapa e barro, com crianças a estudar debaixo de árvores.
O mais grave é que a educação e a comunicação, que deviam ser instrumentos de emancipação, foram sequestradas. A universidade transformou-se em fábrica de carreiras, não em escola de pensamento crítico. Os cursos preparam quadros para obedecer, não para pensar. Produzem chefes de gabinete, não líderes comunitários; especialistas em “projetos”, não revolucionários. Formam “doutores” que falam de Paulo Freire, mas na prática reproduzem o modelo colonial que lhes garante privilégios. Educação que não liberta é só adestramento.
E o jornalismo? Virou cão doméstico do poder. Já não late, já não morde. A comunicação social, pública e privada, vive de comunicados oficiais, de conferências de imprensa e de repetir narrativas técnicas que anestesiam o povo. A denúncia foi substituída pelo entretenimento; a investigação pelo silêncio cúmplice. Hoje, o jornalista que ousa perguntar demais arrisca a sua carreira — ou a sua vida. Comunicação que não revolta, serve apenas para distrair.
Enquanto isso, o povo é enganado com “estratégias de desenvolvimento”, “planos de resiliência”, “programas de inclusão” e outras palavras importadas. A realidade continua a mesma: hospitais sem medicamentos, escolas sem carteiras, bairros sem água. Mas a elite preta, com o seu “diplomazito” emoldurado, sente-se autorizada a explorar outros pretos. Vestem-se de “Excelências”, falam em nome do povo, mas não vivem com ele, não sofrem com ele, não morrem com ele.
A traição está aqui: a ruptura que nos prometeram foi apenas estética. Tiraram a estátua do colono, mas mantiveram o sistema. Mudaram as bandeiras e os hinos, mas deixaram intactas as engrenagens de exploração. A comunicação e a educação, que deviam ser trincheiras do povo, foram convertidas em vitrines para legitimar as desigualdades.
Por isso, continuamos primeiros no sacrifício e últimos no benefício. Continuamos a morrer em hospitais sem médicos, a atravessar estradas cheias de buracos, a trabalhar sem salários dignos — enquanto os “Senhores Doutores” se divertem em seminários internacionais a discutir soluções que nunca descem ao chão.
Chegou a hora de dizer basta. Não precisamos de mais retórica académica, nem de teses que ficam em prateleiras. Precisamos de uma educação que ensine a interpelar, a exigir, a construir. Precisamos de uma comunicação que denuncie, que desmascare, que chame os ladrões pelo nome. Servir o povo não é citar-lhe autores estrangeiros, é construir com ele um saber que revolte, que emancipe, que rasgue o medo.
Porque amanhã, quando alguém erguer outro prédio de 15 andares, temos de ter a coragem de lhe perguntar sem rodeios: “Camarada, onde arranjaste esse dinheiro?
2025/12/3
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