Luis Munguambe Junior"
Há momentos em que me sento a olhar para os números. Sim, números. Gráficos, tabelas, percentagens. Falam-nos de crescimento económico, de redução da pobreza, de em pregos criados. Dizem-nos que o país avança, que estamos melhor do que estávamos. Mas, no fundo, pergunto-me: onde está o rosto, o nome, o suor do povo nesses números? Quando é que o povo deixou de ser gente para se tornar estatística?
Os números não têm alma. Não carregam o peso das costas de uma mãe que trabalha três turnos para alimentar os filhos. Não contam as lágrimas de um jovem que perdeu a esperança de encontrar um emprego digno. Não têm espaço para o silêncio das crianças que vão para a escola de barriga vazia, porque a fome não cabe numa tabela.
E, no entanto, somos bombardeados com eles. Os discursos oficiais são recheados de percentagens que parecem promissoras. “A pobreza caiu X por cento.” “O desemprego desceu Y por cento.” “A economia cresceu Z por cento.” Aplaudimos, acreditamos, porque é mais fácil aceitar os números do que encarar a realidade. Mas eu vejo para além dos números. Vejo a senhora que vende frutas na esquina, com as mãos marcadas pelo trabalho árduo e um sorriso que disfarça a exaustão. Vejo o estudante que caminha quilómetros até à escola, porque acredita, contra todas as probabilidades, que a educação pode mudar a sua vida. Vejo o velho que aguarda por uma reforma que nunca chega, sentado na sombra de uma árvore, com o olhar perdido no horizonte.
Essas pessoas não estão nos gráficos. Não fazem parte dos discursos. São invisíveis para os que governam com base em estatísticas. Porque é mais fácil olhar para o progresso como algo abstrato do que enfrentar o sofrimento concreto de quem vive na margem. E aqui está o problema: quando o povo se torna apenas estatística, perde-se a humanidade. Os governantes esquecem que cada percentagem representa vidas reais, histórias únicas, esperanças e dores. Esquecem que o desenvolvimento não é apenas uma questão de números, mas de justiça, de dignidade, de respeito por aqueles que constroem o país todos os dias. Não estou a dizer que os números são irrelevantes. Eles têm o seu lugar. Mas não podem ser o único critério para medir o sucesso de uma nação. O verdadeiro progresso não se vê nas tabelas, mas nas ruas. Vê-se quando uma criança tem acesso a uma educação de qualidade, quando uma família tem comida na mesa, quando um trabalhador é tratado com respeito.
Se queremos mudar, temos de começar por exigir mais do que números. Temos de exigir histórias, rostos, compromissos. Temos de lembrar aos que nos lideram que o povo não é um conjunto de dados, mas uma força viva, vibrante, capaz de transformar o país – desde que lhe sejam dadas as ferramentas e oportunidades para o fazer. Eu recuso-me a aceitar que sejamos apenas estatística. Porque, enquanto formos tratados como números, as decisões continuarão a ser feitas em nosso nome, mas nunca em nosso favor. E, até que isso mude, continuaremos a lutar, não contra os números, mas contra a desumanização que eles representam. O povo merece mais do que gráficos. Merece ser ouvido, respeitado, valorizado. E merece, acima de tudo, lembrar aos que estão no poder que por detrás de cada percentagem há um coração que bate, uma voz que clama e uma vida que importa.
2025/12/3
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