Diploma na Mão, Mente Vazia: A Crise da Juventude Despreparada para a Realidade

Luís Júnior"

Estudei, como mandam as regras. Entrei para a escola aos seis, aguentei os professores, os testes, a pressão, o barulho da sala e as promessas que vinham sempre com o mesmo refrão: “Se estudares, serás alguém na vida”. Fiz o que era suposto. Fiz a minha parte. E agora? Agora estou aqui, diploma na mão, e nada nos bolsos. Pior ainda, cabeça cheia de teorias vazias e coração empanturrado de frustrações. É essa a realidade. Uma geração inteira a sair das universidades com títulos e sem noção. Com notas no boletim, mas sem ferramentas para a vida. Não é falta de esforço, não. É o sistema que está mal montado, desfasado, desonesto. Promete futuro e entrega desilusão.

Hoje, a universidade parece mais um ritual do que um caminho. Tu vais porque é o que se espera. Entrar, pagar, estudar, formar. A questão é: formar para quê? Para quem? O mercado não mais aceita amadores, está  a pedir competências, mas a faculdade está a servir fotocópias. Te enchem de PowerPoint, bibliografia estrangeira e exames de escolha múltipla, e depois soltam-te na rua como se fosses produto acabado. Mas produto de quê? De um curso que ninguém quer? De um saber que ninguém usa? De professores que não tem noção do mercado e te ensinam a partir de manuais desactualizados? De currículos montados para impressionar reitores e não para resolver problemas reais?

Estamos a formar gente que sabe dizer tudo, mas nada sabe fazer. Que pode explicar o ciclo de vida de uma organização, mas não consegue resolver uma reclamação de cliente. Que tem média de 17 valores, mas não sabe trabalhar em equipa, liderar, pensar. É duro? É. Mas é verdade. A juventude está a sair da escola despreparada para a vida. E a culpa não é só dela. Vivemos num País onde se confunde diploma com competência. Onde se acredita que estar formado é o mesmo que estar pronto. Mas não é. Um diploma é só papel. O que vale é o que sabes fazer com ele. E, infelizmente, a maioria não sabe. Porque a faculdade não ensinou. Porque o docente não exigiu. Porque o sistema está preocupado com estatísticas de graduação, não com impacto social ou empregabilidade.

Pior ainda: a juventude começa a perceber isso tarde demais. Depois do estágio não remunerado. Depois da terceira entrevista que não deu em nada. Depois do voluntariado disfarçado que só encheu o bolso do patrão. Aí sim, a ficha cai. E o desespero começa. E o discurso muda: “Talvez devias empreender”, dizem. Como se empreender fosse apertar um botão. Como se tivéssemos financiamento, rede de apoio, estrutura. Como se viver de sonhos fosse suficiente para pagar contas. Entretanto, os pais continuam a pagar propinas, a dizer ao vizinho “o meu filho está a estudar na faculdade tal”, como se isso fosse selo de qualidade. E as instituições de ensino continuam a abrir vagas, a inventar cursos com nomes que nem os empregadores entendem. E o País continua a empurrar jovens para um abismo, com um sorriso institucional nos lábios.

E nós, os jovens? Uns vão embora. Outros afundam-se em “formações complementares”. Outros, como eu, começam a gritar. Porque não dá mais para fingir que está tudo bem. Não está. Estamos a sair da escola sem saber como viver. Sem saber como negociar, como liderar, como resolver. Pior: sem saber o nosso valor. Não basta formar. É preciso preparar. Ensinar competências práticas. Ensinar a pensar, a agir, a adaptar. Ligar a academia à realidade. Abrir as universidades ao mundo real. Avaliar docentes não só por antiguidade, mas por relevância. Pôr o estudante em contacto com a vida, com os problemas do país, com os desafios que vai enfrentar. Formar para o agora, não para o mundo ideal dos livros.

E precisamos, sobretudo, de honestidade. De dizer ao jovem que não, não basta estudar. Que o mundo não vai abrir as pernas só porque tiraste um curso. Que o diploma é só o começo. Que tens de te mexer, de aprender fora da sala, de ganhar calo, de errar, de cair. E que ninguém te deve nada. Nem o Estado, nem a empresa, nem a sociedade. Sim, a faculdade é importante. Mas não é tudo. Não é mágica. Não é garantia. E o mais perigoso é continuar a empurrar jovens para esse engano. Porque depois de quatro anos de investimento, quando o mercado te vira as costas, o que fica é a frustração. É o sentimento de falha. E com isso, perde-se mais do que dinheiro: perde-se energia, perde-se tempo, perde-se fé.

Escrevo esta crônica porque estou no meio do fogo. Eu sou esse jovem com o diploma na mão e a mente cheia de dúvidas. E sei que não estou sozinho. Milhares estão comigo, à espera de uma oportunidade, de uma luz, de uma saída. Mas talvez tenhamos de ser nós a criar essa luz. A sair da fila. A quebrar a narrativa. A exigir um novo modelo de ensino. Um novo tipo de formação. Um novo respeito pelo nosso tempo, pela nossa inteligência, pelo nosso potencial.

Porque o que se passa hoje é crime. É uma máquina que consome juventude e caga frustração. Uma indústria de sonhos falhados. Um ciclo que precisa ser interrompido antes que seja tarde demais. Chega. É tempo de parar de fingir que o problema é o estudante. O problema está em cima. Está no topo. Está nas políticas, nos currículos, nas lideranças que nunca sentaram numa sala de aula real. Está nos reitores que não ouvem alunos. Está nos ministros que falam de juventude mas vivem rodeados de secretários.

Diploma na mão, mente vazia. Eis o retrato de uma geração que acreditou no sistema e levou uma rasteira.

2025/12/3