Luís Júnior"
Dói escrever isso. Mas alguém tem de dizer. A África, esse colosso de solo fértil, braços fortes e história milenar, continua deitada, anestesiada. Uma potência que ronca alto enquanto outros banqueteiam-se com os seus recursos. Um continente que tudo tem, mas tudo falta. Um lugar onde a terra dá diamantes, mas o povo mastiga poeira. Chega de panos quentes. Chega de discursos redondos. A África está adormecida não por acaso, mas porque colocaram anestesia no seu café da manhã. Não acorda porque os que a dominam aprenderam a dopar seus líderes com migalhas de poder, com cadeiras estofadas e conferências que não mudam nada. Acorda, África! Estás a ser saqueada à luz do dia, e ainda aplaudes os ladrões. Não falta petróleo, nem gás, nem ouro. Falta vergonha na cara. Falta rebelião. Falta sangue quente nas veias de quem governa. Os presidentes africanos – salvo raras exceções – parecem mais embaixadores de interesses estrangeiros do que líderes do seu povo. Sentam-se em tronos falsos, enquanto entregam os cofres ao estrangeiro e pedem “ajuda humanitária” como se não soubessem que o mundo só ajuda onde lucra. Os chineses? Já construíram estradas, hospitais, até parlamentos. Mas e os contratos? E os juros escondidos? E as concessões obscenas? Os americanos, europeus, russos… todos com o mesmo apetite: minérios, terras, influência geopolítica. E nós, sempre com a mão estendida. Somos tratados como quintal do mundo. E há quem ache isso “parceria”. A juventude africana – essa sim é o que ainda nos resta de esperança. Gente que pensa, que grita nas redes sociais, que arrisca a vida para fugir pelo Mediterrâneo porque já não aguenta viver como prisioneiro no próprio país. Mas será que só nos resta fugir? Só nos resta sonhar com Lisboa, Paris, Londres? Ninguém sonha com Maputo, Kinshasa, Luanda? Por quê? Porque aqui não se vive. Sobrevive-se. Um continente que exporta matéria-prima e importa tudo o resto. Que vende cacau e não fabrica chocolate. Que tem lítio, cobalto, coltan, mas importa telemóveis. Que tem florestas, mas importa móveis. Onde já se viu isso? É suicídio econômico com assinatura africana. E não, a culpa não é só dos colonizadores. Eles partiram com as bandeiras, mas deixaram as amarras. E nós, em vez de arrebentá-las, engraxamos as correntes. Acordamos todos os dias para servir sistemas que não desenhamos. Celebramos eleições onde ganha sempre o mesmo grupo. Criamos Ministérios que só servem para empregar sobrinhos e gastar fundos. Tudo isso com a etiqueta de “desenvolvimento”. Onde estão os intelectuais? Os professores? Os artistas? Os jornalistas que preferem a verdade ao protocolo? Estão calados, cansados, censurados ou vendidos. E quando alguém se levanta, é acusado de ser radical, terrorista, divisionista. Tudo, menos patriota. Porque patriotismo, para eles, é calar-se e bater palmas. E as igrejas? Mais preocupadas com o dízimo do que com o destino do povo. Enquanto a fome reina nos bairros, os pastores desfilam de jipe. Prometem o céu, mas ignoram o inferno que já vivemos aqui. Falam em milagres, mas aceitam a miséria como “prova de Deus”. O que ninguém quer admitir é que África tem tudo para dominar o mundo. Tudo. Mas falta-lhe coragem. Falta-lhe estratégia. Falta-lhe amor-próprio. Continuamos a nos ver como inferiores, como eternos aprendizes, como laboratório de experiências políticas, econômicas, sanitárias. Enquanto não deixarmos de ser colônia mental, seremos sempre colônia material. E o que é pior: essa letargia virou hábito. A gente já nem se indigna. Já nem protesta. Já nem se espanta. Crianças sem escola? Normal. Hospitais sem remédios? Normal. Professores sem salário? Normal. Roubo descarado nos cofres públicos? Normal. Importar cebola e tomate com terras férteis a apodrecer? Normalíssimo. Mas escuta bem: a África só está adormecida. Ainda respira. Ainda pulsa. Ainda há tempo. Basta um grito coletivo para rasgar esse manto de mediocridade. Um levante de consciências, não de partidos. Uma rebelião intelectual, cultural, ética. O verdadeiro despertar não virá das elites nem das multinacionais. Virá do povo cansado de ser capacho. O futuro da África não será importado. Terá de ser construído, suado, pensado. Chega de copiar modelos que nunca nos serviram. Chega de confiar em quem só quer sugar. Precisamos de líderes que não temam o povo. Precisamos de povo que não idolatre líderes. Precisamos, acima de tudo, de vergonha na cara. E de raiva no coração. Sim, raiva! Porque a raiva é o motor da mudança. África, tu és gigante. És solo de reis, berço de civilizações, mãe do mundo. Mas estás a dormir. E o mundo está a roubar-te em silêncio. Acorda. E quando acordares, acorda com fome. Fome de justiça. Fome de respeito. Fome de autonomia. Porque o dia em que a África acordar, o mundo inteiro vai tremer.
2025/12/3
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